12 de novembro de 2010


Todos juntos (ou) Sgt. Pepper's

Poesia (ou) Blackbird...

Pulsação (ou) Paul: get back!

O êxtase (ou) The end...

A fila (ou) Good day sunshine... !


Todas as notas (ou) Hey Jude...

A ansiedade (ou) Let me in !





Como transmitir o que as palavras não alcançam? Como transmitir o êxtase, o desbordamento, a infinitização das intensidades, o excesso que pulsou e segue pulsando em meu corpo, sobras de uma experiência impossível de metabolizar?

Como transmitir o que não se acomoda nas pequenezas de nossa vida mundana, o que transcende o imaginável? Como transmitir um prazer e uma alegria tão incomensuráveis que chegam a ser dolorosos, angústia inevitável quando chegamos tão ali, bem ali, tão próximos?

Como transmitir se me falta a voz, se o corpo recusa-se a voltar às engrenagens, ressentido daqueles dois dias em prontidão, no hotel ou na fila, horas e horas a fio, sob a noite e vento ou sob o sol escaldante, sem pestanejar?

Como transmitir tudo o que vivi naquele domingo, tudo o que significou na (e desde) minha história, minha relação com a música, minha posição no mundo?

Claudico. Assumo que há um impossível em jogo e a limitação inerente a estas linhas. Tudo o que vivi foi mais, e mais, e ainda mais (reticências ad infinitum). Eu cantei como louca, pulei como louca, chorei como louca, um sorriso que não cede do rosto. Let it be...

E então já não sei onde termino, onde começa o grito ali ao lado, onde Paul me chega, onde chega minha voz. E ao final, resta a estranha sensação de que, para certas experiências, não haverá uma segunda vez.

Viva os Beatles!

Viva Paul!!!

2 de novembro de 2010


Das pequenas e grandes vitórias.

"O que importa é aprender a esperar. O ato de esperar não resigna: ele é apaixonado pelo êxito em lugar do fracasso. A espera, colocada acima do ato de temer, não é passiva como este, tampouco está trancafiada em um nada. O afeto da espera sai de si mesmo, ampliando as pessoas, em vez de estreitá-las: ele nem consegue saber o bastante sobre o que interiormente as faz dirigirem-se para um alvo, ou sobre o que exteriormente pode ser aliado a elas. A ação deste afeto requer pessoas que se lancem ativamente naquilo que vai se tornando (...)". Ernst Bloch, "O princípio esperança", vol. 1.

Quando entrei na UFRGS como estudante, no já longínquo ano de 2001, a universidade pública encontrava-se em estado de inequívoco sucateamento. Literalmente, por assim dizer. Cadeiras quebradas, banheiros detonados, sequer podíamos dispor de luxuosos artigos como papel higiênico. Nossa biblioteca encontrava-se atafulhada de caixas cujos livros não podiam dispor-se à consulta e proveito dos alunos, por falta de espaço físico. A falta de recursos humanos evidenciava um cenário de de desinvestimento em cascata. Quem não é valorizado, não valoriza.

Ainda assim, um ano antes deste ingresso já me encontrava irrevogavelmente fisgada pelo apelo (então quase místico) daquele nome, a UFRGS. Por ocasião da formatura de uma prima, prometi a mim mesma que colaria grau naquele salão de atos. Foi o vislumbre de futuro necessário ao empuxo dos estudos, tão desgastantes - como bem o sabem todos os vestibulandos.

No primeiro ano de faculdade, provamos o sabor amargo de uma greve de meio ano. As aulas, que deveriam iniciar em julho ou agosto, foram retomadas somente ao final de dezembro. Foi um verão de suplícios, um calor infernal que nem os ventiladores adquiridos com dificuldade pela turma (!!!) conseguiam amenizar.

Tive o privilégio de presenciar, ao longo de minha vida acadêmica e também na primeira pós-graduação, as diferenças que o governo Lula situou ao ensino. Como servidora pública, este investimento tornou-se ainda mais perceptível. Meu início como psicóloga desta universidade deu-se precisamente em paralelo a uma ampla revisão salarial, que nos outorgou três reajustes e uma mudança radical em termos de plano de carreira e incentivo à produção de conhecimento. Não se fizeram necessárias greves, pois para o diálogo, finalmente, havia lugar.

Junto de mim, ao final de 2008, ingressaram mais de cem servidores técnico-administrativos e um contingente altíssimo de docentes para as mais diversas áreas. Contratações (relativas aos técnicos) que não ocorriam há quatorze anos, se não me engano (ou algo desta magnitude!). Junto disso, uma notória ampliação de vagas em distintos cursos e novas graduações iniciadas. Em pleno estágio probatório, não somente me é permitido como incentivado que esteja com um mestrado em andamento. Uma outra lógica, que inverte a equação dos gastos públicos.

Não tenho conhecimento suficiente para uma análise ampla de todas as variáveis que envolvem a complexa máquina política de um país da grandeza (em tamanho e potência) do Brasil. Mas, ao menos no universo ao qual me encontro submersa, da saúde mental e da educação, alguns questionamentos e evidências tornam-se impostergáveis.

É neste sentido que fui tomada por um medo imenso do retrocesso que poderia ser a eleição de Serra. E por isto que me engajei, a meu modo, por Dilma. Este incipiente engajamento me levou a novas conversas, leituras, interrogantes e encontros. E comemorei por estas arestas, deveras feliz, neste último domingo.

Termino com duas colocações de nossa nova presidente, em seu primeiro discurso oficial:
"Falavam que tinham que arrumar a casa primeiro. Falavam e nunca arrumavam. Porque é impossível arrumar uma casa deixando dois terços dos filhos ao relento, à margem do progresso e da civilização. Resultado: o Brasil era uma casa dividida, marcada pela injustiça e pelo ressentimento, que desperdiçava suas melhores energias. Nós, do governo do presidente Lula, fizemos o contrário. Chegamos à conclusão de que só fazia sentido governar se fosse para todos. E provamos que aquilo que era considerado estorvo era, na verdade, força e impulso para crescer".

"Não nego a vocês que, por vezes, algumas das coisas difundidas me deixaram triste. Mas quem, como eu, lutou pela democracia e pelo direito de livre opinião arriscando a vida; quem, como eu e tantos outros que não estão mais entre nós, dedicamos toda nossa juventude ao direito de expressão, nós somos naturalmente amantes da liberdade. Por isso, não carregarei nenhum ressentimento. Disse e repito que prefiro o barulho da imprensa livre ao silêncio das ditaduras".

Adelante!


24 de outubro de 2010


Pout pourri de um domingo à noite

. Com meu cartão-ingresso tendo, num descuido, viajado ao Rio de Janeiro, não me restou alternativa a não ser o bom e velho radinho. E, ademais, estando boa parte da nação tricolor nas entranhas do Monumental, providenciei todas as possíveis vedações acústicas e visuais asseguradoras de uma segura distância de meus importunos vizinhos colorados. Faço um parênteses, imbuída que estou, ultimamente, de reflexões filosófico-político-sócio-existenciais: não me encontro, nem de perto, conectada ao futebol como outrora. Mas, é impossível não vislumbrar as mudanças contundentes que se instalaram no cotidiano da prosa e flautas comuns à rivalidade azul e vermelha.

Os torcedores colorados, desde que passaram a figurar no cenário das vitórias, tomaram-se de uma arrogância desmedida. O Inter vibra incessantemente de seu poderio financeiro. Um clube que já ousou denominar-se "do povo" sucumbiu à máquina capitalista-estratégica-administradora-etc e tal. Tamponam até mesmo os esparsos movimentos clubísticos de abertura ou oposição. Daí que um torcedor diz a seguinte frase, na rádio Gaúcha, logo após o fim do jogo: "Não tem como comparar um GRANDE time como o Inter com um time que tem esses Vilson, Gilson da vida. É ridículo. Time tem que ter é um D´Alessandro. F... o sonho da Libertadores pra eles".

Ora, eu preciso responder a este cidadão que muito me orgulho de torcer para um time formado por Vilsons da vida. Sem badulaques ou badalações. Para um time que, na humildade de sua garra inesgotável, contrariou as sádicas previsões de um terceiro período na série B para uma arrancada incrível que lhe outorga 80% de aproveitamento no returno, e uma possível luta pela L.A. 2011. Para um time que vive e sofre na sua alegria imperfeita, na agudeza de suas dívidas, na desordem de sua política inexata, no ir e vir do êxtase e das dores, no passado de glórias e nas pinceladas de conquistas no hoje. Diria um tio meu que "um time cujo craque é Jonas não será campeão de nada, nunca". Pode ser que não. Mas, como torcedora do Imortal, não meço minha paixão em euros nem em títulos. Eles podem vir, a seu tempo - e o sentimento... este não se termina.

. Ando permeada de depedidas. Despeço-me de alguns eus. Estranho. O estável de nós como liberdade de mundo.

. Avante Dilma!

5 de setembro de 2010

Barcarolle from 'Les contes d'Hoffmann' by Offenbach

É um encontro adiado. Porque de tão intenso quase impossível. Porque tão de mim quase já
cego.

É do aquém-etéreo. É do amanhecer. É da geada.

É do desconforto do que me fora roubado, do ventre manso.

É da fuligem. É da vertigem.

É da cama alinhada. Da poeira torta. Do caminhar pesado, do olhar
cerrado.

É do alívio pelo mesmo. É da saudade do que nunca. É do suspiro pelo em
tanto.

De cores improváveis. Feito desejo de terra úmida. Feito zumbido
de vento.

É de linho. É de embaraço. É de boca cheia que não pode
falar.

É de-composto. Um assim.

(joaninhas em lufadas).

É de janela. É de arrebatamento.

Eu ali.

23 de agosto de 2010

Segunda-feira, vinte e três de agosto de dois mil e dez, vinte e duas horas e dezenove minutos.

"Sobre importâncias

Manoel de Barros

Um fotógrafo-artista me disse outra vez: veja que pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar. Falou mais: que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem com barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós. Assim um passarinho nas mãos de uma criança é mais importante para ela do que a Cordilheira dos Andes. Que um osso é mais importante para o cachorro do que uma pedra de diamante. (...) Há um desagero em mim de aceitar essas medidas. Porém não sei se isso é um defeito do olho ou da razão. Se é defeito de alma ou do corpo. Se fizeram algum exame mental em mim por tais julgamentos, vão encontrar que eu gosto mais de conversar sobre restos de comida com as moscas do que com homens doutos."

20 de agosto de 2010



Despedidas

. Sensível como poucos, ele foi o primeiro a me acalmar: "estás no caminho certo". A palavra era de ouvido.

. A saudade é um sentimento estranho, por vezes oco, por vezes tão atafulhado de lembranças que elas parecem transbordar entre as imagens, ecos de voz, lágrimas que turvam a visão.

. Dali veio o grito, a mesa farta, o sensível, o assovio que perambulava pela casa, como se os próprios passos compusessem uma melodia.

. É preciso reorganizar. É preciso sustentar espaços de silêncio na agenda, acolher a dor e o ímpeto de viver. A vida com novas cores.


9 de agosto de 2010



I. Consigo tirar as anotações escondidas abaixo dos livros que dormem docemente empoeirados à mesa. Minha vida em uma quase-suspensão. Queria poder pedir ao mundo que me espere, logo chego. Não alcanço, falta fôlego. O cálice de vinho e o barulhento aquecedor me acompanham na tentativa de retomar a vida.

II.

III. Queria o piano ao meu lado. Queria os seus olhos fechados e seu ouvido de assombrosa delicadeza. Desejo um instante mais, apenas, daquela canção.

IV. Do blog, da vida: à margem.


24 de junho de 2010

Afetações

I.

É pastoso. Escorre, mas com tamanha lentidão que me rasga em algum impossível. É grudento, dilatado, espraia-se por entre os mais ínfimos sussurros. Do grito à mudez, do murmurar ao silêncio.

(Andei todo o caminho com os olhos manchados de um negro-frustração).

O movimento é um sem mover-se. É amansamento da brisa, é apaziguamento do que pulsa, são lufadas de hábitos e velhosidades e ransos que recusam-se ao desassossego, que sonegam o descompasso, que atolam-se na inércia, que liquefazem o disruptivo, que achatam em uma melodia monocórdica os agudos, que não se privam de aplanar o desconcerto.

(Um como-foi).

E, em sua cegueira, estão a tatear-se na escuridão das lâmpadas fluorescentes. Afogamento da boca faminta e sedenta e ruidosa. Atiram-se pedras no moinho: e que cesse o giro, e que acomode-se enfim o cotidiano em seu mesmo, e que cada dia seja apenas um ontem a mais.


II.

Ali onde se toca o conto
e que de duas palavras, fez-se
canção.
Aspiro,
respiro,
inspiro.

Poemizo carregada de eu,
precisando diluir-me em alguma nota
dissonante,
algum noturno audaz
em sua brevidade,
quase
anestésico
do existir.

III.

E meu receio era do arrebatamento:
um corpo-ouvido
infinito.
Que de meus poros, a fugacidade
do sensível
perceba-se, em uma qualquer
manhã
desencontrada da afetação.

27 de abril de 2010

Notas porteñas (ou: a posteriori):

"Trato de existir: arte!
Penso resistir...

Às vezes desistir? Em parte.
E só assim insistir..."

Chica: gracias infinitas pelas palavras que só agora me chegam.

23 de abril de 2010



Solitárias, elas reverberam por toda a casa. Vão desta poltrona à parede. Esbarram no Van Gogh. As notas, sempre elas. A lembrar-me oportunamente do que pulsa.

Desde muito cedo, é certo. Tocavam-me, atavam-me. Um devaneio sem palavra. Era antes: de corpo e seus mais minúsculos poros de afetação. Era invasão, nem sequer escolha. Musicar me tinha, eu musicando.

Queria transpor do que faz pensar: impossível. Ao menos um pouco, tentamos. Afoito, o vinho quer fazer-se poema. Quer amainar as durezas do cotidiano. Quer deixar entrar o frio tímido que se ensaia ali fora, logo ao lado.
Que as folhas entrem em desordem, em seu canto dissonante.


(Com)posições

É um aparente paradoxo, este hiato. Uns pedem âncora, outros silêncio. Faz-se limbo.

É preciso encontrar um lugar-entre, que me permita a luta sem o embate. É preciso saber operar o silêncio sem esmorecer o desejo. É preciso aprender, de algum jeito, a (...).

E sabem quando algo volta a ti em caráter de tamanho estranhamento que, por instantes de absoluto desnorteio, tu te perguntas: onde estou, afinal? Evanescimento de sentidos. Do que se julgava ser, crer, ter, transmitir. Tem minhas pinceladas ali. Acolá também. Tão perto que invisíveis.

Não se pode aceitar o silenciamento dos afãs e das mobilizações e das vontades - disto que faz movimento, que faz aresta, que faz viver. Mas, tampouco se pode gritar tão alto que ensurdeça a palavra.

Micropolítica ali onde a trama se pensa alheia: eis o desafio.

1 de abril de 2010

TORPES DIVAGAÇÕES

É preciso fazer névoa disso cru. Falta-me o tempo, falta-me o silêncio, falta... Um cálice. Giros insistentes de ar morno, entremeios de distantes intimidades.
Do que insiste: o excesso.
Do que aconchega: tua errância.
Do que alenta: o amanhecer.
Carrego-me dia afora, no paradoxo de uma alegria estafante. Sossego - preciso - sossego

20 de março de 2010

Outra nota

Era preciso dizer-lhe, mas tão aquém, mas tão fugaz: que era de melodia que se tratava, que era de corpo e voz e riso e pele e seu breve instante de róseo embaraço. Que já pouco de dentro, mais e mais do contorno. Que a palavra quase como fulguração. Que era vida, tão vida. Os olhos se seguram como podem. Queria dizer-lhe, mas melhor o fazia em silêncio.