28 de maio de 2006

Quarto Motivo da Rosa
Cecília Meireles

Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.

Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.

Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.

E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.
E por que o amor se enrola e se finda na sua própria graça,
por que o amor se desgraça,
por que o amor despedaça?

(na íntegra ver a comunidade da Confraria! >> http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=3777481)

Que me faça, ou desfaça, ou refaça; que me trapaceie, acene, vislumbre. De dedos e notas, devotas, os sons - se vão (e não vêm de volta). Me somem, consomem, assustam, encenam, metidos, enlouquecidos - e os mando: calem a boca! Mas que boca, que voz, que nada, que ruído cansado, que reflexo tosco, teu rosto, nas teclas. Me volto, revolto, te solto. Te cerco, incerta, decerto... Dedilhando teu corpo, me entrego, envolvo meu pretexto, desconsidero o tempo da partitura. E ela não segura, te surra, te bate, me avança e descansa, se arde, se morde, se cria.

(Inventava e partia).

26 de maio de 2006

É necessário derrubar o pedágio entre a poesia e a poesia encadernada. Os leitores mudam o olhar quando alguém diz: "vou ler um poema?". Ninguém deve se preparar para viver. Vive-se em desconcerto. O poema deve ser dito sem solenidade, em uma mesa de bar, em uma parada de ônibus, ao localizar uma rua ou uma lembrança extinta.

Fabrício Carpinejar

22 de maio de 2006

Tudo começou numa noite gelada de 23 de maio, friaca das brabas, tal qual a meteorologia de novo aponta para o dia de amanhã.

Grêmio x Pelotas, também um jogo brabo - mas lá fomos, na raça, em direção ao Monumental. Eu, Manoel e Mateus, trio-parceira de um sem número de indiadas.

Mateus bebeu conhaque pra espantar o frio .

Madrugada adentro ainda bebemos uma gelada, que nos fez sentir que ainda havia algo mais petrificado que nossos dedos.

Mas para os dedos, há o bolso de um casaco azul-marinho. E aqueles dedos insistiram pela companhia dos meus, nos passos vagarosos de um retorno imprudente e, quiçá, já enamorado.

No meu colo, deitas e vêm as palavras. Depois delas, nada se pode fazer se não
um beijo.

Um primeiro encontro, e a primeira falta quando tua boca descolou da minha.

O primeiro olhar de estranhamento, encontro e desencontro, tudo junto, é sempre junto...

Não dormimos, mas o sono não fez falta. O apaixonamento opera milagres no teu estado de espírito e na disposição do corpo.

Eu apenas desejei que o tempo logo passasse que se aproximasse o dia em que te veria de novo.
Prévia de uma noite 23...

De tudo, o agora.
Nada mais que isto temos, uma noite
e dois copos de vinho.
Uma vela que se interponha entre nosso olhar de reencontro
e de uma chama que faça de tua imagem nebulosa.
Quem olho?
Já não sei quem és, te tenho de um amor outro,
e me tens antes de mim, de um sentido sem
palavra.
Mas sintamos, apenas,
sintamos.

20 de maio de 2006

Por que, afinal, nada te deixa escorregar no vazio de mim?
Por trás da insanidade, do desespero, dessa tua ardência de uma raiva desmedida,
alimento a fantasia de que haverá um desamparo a te trazer
de volta.
É desse olhar enlouquecido, matando meus sentidos pelas beiradas,
assassino de meu júbilo, de torturas de um além-sem-fim,
que falo.
Não calo.

4 de maio de 2006

"Fazer as coisas pela metade
é minha maneira de terminá-las"


Fabrício Carpinejar








Nos céus acizentados, centelha de vontade,
te busco e não te encontro no calor de um café.
Companhia pra solidão de um momento futuro tão insignificante.
Nem milhares de notas preenchem o vazio
do teu corpo
em mim.
Que deslizar suave tuas mãos meu pensamento
- nuvens andarilhas no deserto de nós dois.
Trilhas de algodão, caminhos de amanhã,
resquícios de um sonho que passou.

3 de maio de 2006

Desses passos pesados de calçada molhada
e olhares escondidos de guarda-chuva,
o aconchego da chegada.
Se parte, reparte, retorna.
Não saio de onde vim nem chego onde estou
- me restam as marcas do caminho.