25 de julho de 2011



DA INSISTÊNCIA

Construo pontes. Há dissonâncias intransponíveis e, ao mesmo tempo, olhares que se entrecruzam em cumplicidade: encontro no desalento. Queremos falar, mas o silêncio é imperioso. Rubores, cabeça baixa, dizeres claudicantes. Aventa-se resgatar o ontem, mas do ontem pouco resta. Mais bem: resquícios nebulosos de dias festivos e efusões palavreiras e amanheceres de entusiasmo e pastas abarrotadas. No fim das contas, já sabemos. Queremos insistir, contudo. Fechamos a reunião com um sorriso tão triste quanto sincero. O salto derrapa no piso frio, exausto da escuridão. E esta umidade que faz doer as costas, e esta cortina empoeirada que sufoca as narinas, e esta porta a ranger dores tão íntimas de nós.

DA ESPERA

Planilhas transbordantes
assentam rotinas:
alaranjados passados,
ventanias lilases.

(Pairam, em quietude,
histórias azul-celeste).

Amarelados limites,
gargalhadas esverdeadas:
somatórias impossíveis
de mim.




3 de julho de 2011

Queda

Os números embaçados insistiam, apesar de tudo, em chamá-lo.
Do outro lado, apenas o registro eletrônico de que ele, deliberadamente, a evitava. Trêmula, bebeu a um só gole aquele uísque caro que ele esquecera em sua casa. Queria aspirá-lo junto dos cubos de gelo, reencontrar seu cheiro no odor nauseante do álcool. As lágrimas queimavam a pele tanto quanto o líquido em sua garganta. A falta corroía-lhe o pensamento, fez-lhe cambalear as pernas e despencar, soçobrante, na poltrona de couro envelhecido.

1 de julho de 2011

Conta-gotas de sexta-feira


1. Saudade

O livro amarelo
dorme a meu lado.

2. Despedida

E, bem assim:
o fim.



Tempo

Uma vez havia um caminho
para voltar.

De barro e úmidas
delicadezas.

Horizonte de estrelas
tímidas e de luz
esguelhada.

Por um tempo
longo e de andor
espesso.

Por um tempo breve
e de passar
cantante.

Pontilhado

A voz úmida com a intempestiva rouquidão. O adorno audaz com a claridade reluzente, quase opressora. O afago acetinado com o olhar áspero. A vertigem com a embriaguez.

Tramam suaves trajetos de contorno, apalpam o riso curvilíneo e manso, dançam uma melancólica canção ao avesso. Abafam com finos toques a agudeza do grito. A voz cálida e contrita cai, sôfrega, embaralhando os nós ainda não desfeitos. Misturam-se os resquícios e os silêncios e os desatinos.

Costura de infinitos pontilhados.