29 de maio de 2008

Das incongruências

Ele espiava com avidez e assombro, os pés de rua, barriga de preces, corpo menino - ainda que já tão-tão noite. Fixava o olhar, extasiado. Os corpos dançantes, as saias a rodar, os machos galanteadores a lançar venenos doces de mão e trova.

Ele não entendia, o magro menino, dos corpos bailantes a sapatear desígnios de uma dor tão sua.

Ele não entendia, quiçá pelo cansaço das horas curvadas, aquele baile a lamber sua terra arranhada deste vermelho-que-sai-do-corpo, aquelas taças a destilar com alegria e adornos os infortúnios de seu destino, reverberando pelas paredes de concreto gritos eufóricos a uma distância regulamentar.

Mas antes que a canção fosse a termo, percebe as cortinas cerradas; ainda quis segurar um suspiro de dentro, respirando tão fundo, enchendo de ar a fome de feijão.